Recentemente li um artigo em que a HP, um dos maiores fabricantes de impressoras, se posicionava contra os cartuchos genéricos ou “pirateados” disponíveis para suas impressoras, alegando que tais cartuchos podem causar danos aos equipamentos, impressões de baixa qualidade e outros problemas.
Deixando de lado as questões inerentes a qualidade de tais cartuchos – afinal, da mesma forma como uma gasolina batizada pode danificar o motor de um carro, um cartucho com tinta ruim pode causar alguns problemas a uma impressora – não pude deixar de perceber que este posicionamento agressivo por parte da HP se deve a um simples fato: a defesa do seu modelo de negócios, conhecido como “lâmina de barbear”.
Em uma observação informal das perguntas postadas neste site pude perceber uma tendência: a de que os usuários utilizam mais as impressoras da HP. Quem me conhece já sabe que normalmente recomendo impressoras da Brother e da Epson por serem muito mais duráveis e confiáveis. Mas o preço mais alto certamente afasta muitas pessoas, que possivelmente pensam que impressoras são todas iguais ou simplesmente não dispõem de orçamento suficiente para adquirir um equipamento melhor. E aí está a base do modelo de negócios conhecido como “lâmina de barbear”.
O funcionamento deste modelo de negócios é muito simples: o produto principal (neste caso, a impressora) é vendido a um preço muito baixo, às vezes até abaixo do custo, com a intenção de remover a primeira barreira de entrada: a aquisição do produto. Uma impressora não funciona sem tinta e nem papel, e com a primeira barreira eliminada criam-se novas oportunidades de negócios: a venda de cartuchos de tinta e de papéis. Se o fabricante é, ou procura ser, o único que pode fornecer tinta e papel para a impressora, faz muito sentido vender a impressora a um preço muito baixo e a tinta e o papel a um preço muito alto – afinal, o usuário sempre vai comprar muito mais cartuchos do que impressoras.
Este modelo de negócios é comumente atribuído ao Sr. King Camp Gilette, criador das lâminas de barbear Gilette, no entanto foram os seus concorrentes que idealizaram este modelo, e o nome se deve ao fato dele ter sido usado primeiro em lâminas de barbear. Este modelo de negócios pode e é usado em diversos tipos de produtos, e é uma boa forma de garantir um fluxo constante de lucros – no caso de uma lâmina de barbear, por exemplo, vende-se o aparelho a um preço baixo e as lâminas de reposição a um preço alto.
Ocorre, no entanto, que este modelo só se sustenta se não houverem concorrentes para fornecer as peças de reposição (cartuchos e lâminas, respectivamente). Como já sabemos o mercado de cartuchos compatíveis ou recarregados já é grande o bastante, oferecendo opções aos consumidores. E com isso, nada mais natural do que a HP tentar se defender dessa “ameaça”, como fez no artigo, sempre alegando que os concorrentes – cartuchos compatíveis e recarregados – são de baixa qualidade e causam problemas, o que nem sempre é verdade. Portanto, leitor, não pense que um fabricante está sendo bonzinho em vender um equipamento a um preço mais baixo que os demais. Lembre-se de que o objetivo dele é te amarrar por muito tempo com a venda de peças e acessórios proprietários que custam mais caro.
Essa mentalidade ainda é muito prevalente em diversos setores, e não apenas no de impressoras, mas felizmente os fabricantes de impressoras estão se conscientizando de que os usuários querem de fato usarem seus equipamentos sem ter que pagar um pequeno absurdo a cada página que imprimem e por isso decidiram abandonar este modelo de negócios. A Epson foi a primeira, com a sua série L de impressoras, a comercializar o equipamento a um preço maior mas a tinta a um preço menor. Nesta linha de impressoras, a tinta é vendida em tubos avulsos ao invés de em cartuchos, e com isso o preço é reduzido drasticamente – um cartucho da HP contendo menos de 5 ml de tinta custa em média R$ 20; um tubo de tinta da Epson contendo 70 ml de tinta custa em média R$ 40. Faça as contas.
Antes de comprar qualquer equipamento – e não apenas impressoras – avalie todos os custos associados, e não apenas o custo inicial de aquisição. Isso vai garantir que você tirará o melhor proveito de sua aquisição.